EMENTA: EMBARGOS DE TERCEIRO - PENHORA SOBRE IMÓVEL OBJETO DE INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - CONTRATO RESCINDIDO POR DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO - CONDIÇÃO DE PROPRIETÁRIO NÃO DEMONSTRADA - AUSENCIA DE POSSE JUSTA - EMBARGOS INADMISSÍVEIS - MANUTENÇÃO DA CONSTRIÇÃO - RECURSO PROVIDO. 1. A partir do trânsito em julgado da decisão que rescindiu o compromisso de compra e venda, determinando a devolução dos valores pagos, devidamente atualizados, a apelada deixou de possuir o justo título, que a legitimava a ajuizar os embargos de terceiro na condição de proprietária e possuidora com justo título.2. O conceito de posse injusta não se infere, apenas, da violência, precariedade ou clandestinidade a que se refere o art. 1200 do Código Civil, entendendo-se como tal, toda aquela que é exercida contra a vontade do dono e por quem não possui justo título. Ela não precisa ser violenta, clandestina ou precária, pois injusta também pode ser a posse de boa-fé.
Trata-se de recurso de Apelação interposto por Domingos Zavanella contra sentença que julgou procedentes os pedidos deduzidos nos embargos de terceiro ajuizados por Janete Vinha Vizu, para o fim de "determinar a baixa da constrição consistente em penhora que recai sobre o imóvel matrícula n. 22.383, do 2º serviço de registro de imóveis desta Comarca" (fls. 99/102). Condenou o embargado, ainda, ao pagamento das despesas processuais e de honorários advocatícios, estes arbitrados em R$500,00 (quinhentos reais).
Domingos Zavanella apela, alegando, preliminarmente, o cabimento da denunciação à lide a quem, efetivamente, teria causado os danos sofridos pela apelada.
No mérito, alega que a apelada não possui domínio e nem direitos sobre o imóvel penhorado, argumentando que o instrumento particular de compromisso de compra e venda, firmado entre ela e a construtora Marcom, restou rescindido pela sentença proferida nos autos de obrigação de fazer nº 615/1997, prolatada em 18.03.199, em que são partes Janete Vinha Vizu e outros x Marcom Maringá Construções Civis Ltda.
Sustenta que a sentença atacada, proferida nos autos de embargos de terceiro, viola a coisa julgada, bem como o ordenamento jurídico como um todo, isto por entender que restou inequívoco o fato de que o imóvel pertence à empresa Marcom Maringá Construções Civis Ltda.
Por fim, requereu o provimento do recurso, para, preliminarmente, acolher a denunciação à lide e, no mérito, reconhecer o direito do apelante em penhorar o imóvel objeto da lide.
A apelada, embora devidamente intimada (fls. 122), não ofertou contra-razões.
Relatados,
VOTO:
Presentes os requisitos de admissibilidade, intrínsecos e extrínsecos, de se conhecer o presente recurso.
Infere-se dos autos, que Janete Vinha Vizu adquiriu, em 14 de setembro de 1994, o apartamento nº 203, bloco A, do Edifício Quintana do Sol, objeto da matrícula nº 22.383, do 2º Cartório de Registro de Imóveis de Maringá, da construtora Marcom Maringá Construções Civis Ltda, conforme Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda, registrado no Cartório de Títulos e Documentos daquela comarca (fls. 20/21).
Segundo o compromisso de compra e venda, cabia à promitente vendedora outorgar a escritura pública definitiva, no prazo de 180 dias, após o recebimento das chaves (cláusula 04).
Como a Marcom Maringá Construções Civis Ltda não outorgou a escritura pública na data aprazada, Janete Vinha Vizu e outros ajuizaram ação de obrigação de fazer (autos nº 615/1997), que restou julgada procedente para fins de: "a) decretar a rescisão dos negócios havidos entre as partes (cfr. Os contratos de fls. 07/08, 20/21; 28-29 e 34-35), tudo nos termos do art. 269, I, do CPC; b) condenar a ré a repetir (restituir, e in integrum) aos Autores os valores por eles pagos, corrigidos a partir dos efetivos desembolsos, mais juros moratórios de 0,5% ao mês, estes também desde então". Segundo relata a apelada, referida sentença encontra-se em fase de execução.
Ocorre que o apelante Domingos também ajuizou ação de obrigação de fazer em face da Marcom Maringá Construções Civis Ltda (autos nº 132/1997), sendo que, pelo que se deduz dos autos, seu pedido foi também julgado procedente.
Em fase de execução de sentença foram penhorados vários bens de propriedade da empresa ré, dentre eles o apartamento anteriormente adquirido por Janete Vinha Vizu.
Diante disso, a Sra. Janete interpôs os presentes embargos de terceiro, requerendo o cancelamento da penhora, bem como a restituição e reintegração de posse.
Inicialmente, necessário esclarecer que os embargos de terceiro, nos termos do art. 1046, do Código de Processo Civil, constituem o remédio processual cabível para proteger a propriedade ou a posse de terceiro, quanto à turbação ou esbulho decorrentes de decisão judicial.
Segundo ensina Vicente Greco Filho, são pressupostos da ação de embargos de terceiro: "a)
uma apreensão judicial; b) a condição de senhor ou possuidor do bem; c) a qualidade de terceiro em relação ao feito que emanou a ordem de apreensão, d) a interposição dos embargos no prazo do art. 1048"1.
No caso dos autos, a autora demonstrou a existência de constrição judicial sobre o bem, bem como sua qualidade de terceira, vez que não figurou como parte na ação que originou o título executivo em execução e que deu causa à penhora do imóvel.
No entanto, apesar de preenchidos estes requisitos, a autora não logrou demonstrar sua condição de proprietária ou possuidora do bem objeto do litígio, o que impõe a improcedência do pleito inicial.
Sobre este requisito, oportuno, mais uma vez, transcrever a lição de Vicente Greco Filho2:
A condição de senhor ou possuidor é a qualidade que fundamenta a pretensão de exclusão. Essa qualidade não é objeto da ação, mas parte de seu fundamento jurídico. Quem não for senhor nem possuidor não tem interesse processual nem legitimidade para os embargos de terceiro.
Analisando os autos, verifica-se que a apelada colacionou o contrato de compromisso de compra e venda que foi rescindido pela decisão judicial dos autos em que contendeu com a ré. Tal decisão transitou em julgado, plenamente.
Ora, como a sentença proferida nos autos de ação de obrigação de fazer nº 615/1997, rescindiu o compromisso de compra e venda entabulado entre a autora e a vendedora, a conseqüência dessa rescisão é a devolução do imóvel à propriedade da promitente vendedora e a sua reintegração na posse.
Assim, a partir do trânsito em julgado da decisão que rescindiu o compromisso de compra e venda da autora, esta deixou de possuir o justo título, que a legitimava a ajuizar os embargos de terceiro na condição de proprietária e possuidora do imóvel penhorado.
Portanto, como restou evidenciado nos autos, a propriedade do imóvel em litígio pertence, efetivamente, à empresa Marcom Maringá Construções Civis Ltda. E, neste passo, a penhora efetuada na execução da sentença proferida nos autos 132/1997 deve ser mantida, pois efetuada em imóvel que já era da empresa Marcom.
Observa-se, ainda, que a apelada não exercia posse justa sobre o imóvel em questão. Sua permanência no local classifica-se como ato de mera tolerância da verdadeira proprietária, e, neste norte, inexiste proteção possessória, pois como dispõe o artigo 1.208, do Código Civil: "não induzem posse os atos de mera tolerância".
Por posse ou detenção injusta entende-se toda aquela que é exercida contra a vontade do dono e por quem não possua um justo título, mesmo que não seja violenta ou precária e mesmo quando não seja clandestina, podendo ser injusta, até mesmo, a exercida de boa-fé.
É que o conceito de posse injusta não se infere apenas da violência, precariedade ou clandestinidade a que se refere o art. 1.200 do Código Civil, entendendo-se como tal, a detenção sem título de propriedade ou sem caráter de posse direta pelas vias adequadas, tendo, portanto, sentido mais amplo.
E, aqui, é de se esclarecer que restou comprovado que a apelada não exerce posse justa sobre o imóvel em questão, vez que o seu título foi rescindido por sentença, não possuindo mais, um título a legitimar sua proteção possessória.
Por fim, registre-se que, com a procedência do recurso, a questão relativa à denunciação da lide resta prejudicada.
De se anotar, ainda, que com a reforma da sentença, impõe-se a inversão dos ônus da sucumbência, que deve ser mantida nos moldes fixados na sentença.
Diante do exposto, VOTO por CONHECER o recurso e DAR-LHE PROVIMENTO, mantendo a penhora sobre o bem objeto do litígio e invertendo os ônus da sucumbência.
ACORDAM os Membros Integrantes da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em CONHECER o recurso e DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator.
Participaram do julgamento o Desembargador Marco Antonio de Moraes Leite (presidente com voto) e a Juíza Substituta em 2º Grau Ana Lucia Lourenço.
Curitiba, 20 de janeiro de 2009.
Des. Francisco Luiz Macedo Junior, Relator.
1 GRECO FILHO. Vicente. Direito processual civil brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 256.
2 GRECO FILHO. Vicente. Direito processual civil brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 256.
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Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
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